quarta-feira, 25 de novembro de 2009

A Bahia Musealizada na arte de Juraci Dórea.


Texto produzido na matéria de  História da Arte Brasileira. Justificativa para o tema: Produzir trabalhos relacionados com os artistas da minha  terra (Feira de Santana). Idéia de voltar-se ao lugar de onde vim.

O Projeto Terra, liderado pelo artista Juraci Dórea, que objetiva, levar para o interior sertanejo baiano, esculturas e painéis executados em materiais comuns à realidade sertaneja, nos coloca diante das reflexões referentes à Nova Museologia .


Ao modificar o foco da produção e exposição de suas obras, dos centros urbanos e galerias de arte para o interior sertanejo, o artista transforma estes espaços que nos marcam por imagens de seca e miséria, em um “grande museu”, que derruba suas pomposas paredes, desconstrói as posturas dos tão comuns museus tradicionais (circuito a ser seguido, peças sacralizadas) e se abre para uma maior interação com o público, com elementos comuns a sua realidade (couro e madeira nas esculturas), numa atitude que nos remete aos ecomuseus, que se apropriam do cenário e historicidade de determinadas comunidades, musealizando os espaços componentes do seu dia-a-dia, sem a necessidade do uso de vitrines e grandes painéis explicativos.

Dentro das resoluções que regem a Declaração de Caracas, que determinam atitudes quanto a atual missão dos museus estes devem “... organizar estratégias que permitam a participação da comunidade na valorização e proteção de seu patrimônio”, o Projeto Terra, envolve-se com a população sertaneja, provocando nestes a reflexão a cerca da arte, sua função e existência, usando cenários como as casas, feiras e terreiros dessas pessoas como suportes para a expressão dessa arte regional, no próprio local onde o artista se inspira para sua criação.

Ao mesmo tempo em que instiga a curiosidade dessas pessoas quanto à concepção de arte , encaramos como um retorno, uma retribuição à inspiração cedida pelo ambiente sertanejo ao artista que recria na sua arte os cenários comuns da sua infância.



FALANDO MAIS SOBRE O ARTISTA E SEU PROJETO

Artista plástico e poeta, o artista também é formando em arquitetura pela Universidade Federal da Bahia. Natural da região de Feira de Santana tem como inspiração para a produção de suas obras a temática do homem sertanejo e a literatura de cordel.

O Projeto Terra se iniciou no ano de 1982, na cidade de Feira de Santana e parte para as localidades de Euclides da Cunha, Monte Santo, Canudos e Raso da Catarina. As suas atividades não se finalizam na construção das esculturas e realização dos painéis, mas por traz deste trabalho, acontece também a sua documentação, através de fotografias e “[...] gravações que registram o conceito que os sertanejos têm da arte” .

Dentre as funções dos museus de catalogar, conservar e preservar damos ênfase aqui, a documentação, realizada no Projeto Terra, que pouco a pouco é publicada pelo artista, em livros e congressos, dando novos significados e sentido às suas obras. Além de servir como asseguração do próprio período histórico e de reflexões acerca do pensamento do povo sertanejo, produz parâmetros para a antropologia, sociologia e a própria sociologia da arte.

Ao passar pelos cenários citados, observa-se que pouco se conservou deste trabalho. Pela própria relação de dessacralização, promovida pelo trabalho do artista e da relação muito particular do homem sertanejo coma arte, o couro das esculturas foi “reaproveitado” para uso nos selas dos cavalos, nas alpecartas, no uso do dia-a-dia do homem sertanejo, tão castigado pelas intempéries do seu habitát.



O HOMEM SERTANEJO E OS ELEMENTOS DE SUA CULTURA REPRESENTADOS NA ARTE DE JURACI DÓREA

Ao se deparar com uma das séries “Fantasia Sertaneja” ou “Historias do Sertão”, o observador identificará símbolos que talvez, - levando em consideração a sua origem, não compreenda claramente.

Envolvidos num cenário que nos remete ao ambiente das feiras nordestinas, atrelados ao dia-a-dia do homem sertanejo, na sua religiosidade, nos objetos de seu uso diário, no seu folclore e na sua própria maneira de se relacionar entre si – a aproximação das casas, o ambiente da “fofoca”, a espera das moças por um bom casamento – Juraci Dórea, abdica do comum tratamento dado a temática que “mistifica” o homem do sertão por alguns autores, e o compõe, ali, de maneira simples e natural, sem “tirar nem por” elementos de suas gloriosas características.

Concluindo, classificamos o trabalho do artista, como promotor de uma nova temática no campo das artes. A produção de arte regional em duplo sentido: a arte regional, por ter como tema características regionais – e regional por ser produzida na própria região que a inspira, musealizando estes espaços.

Voltando ás teorias da museologia, Juraci, produz uma arte que musealiza o sertão baiano, mantendo uma relação de interação e estabelecimento de referenciais de identidade com o público, de forma almejada e não alcançada por muitos museus.



REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

Declaração de Quebec, 1972, Canadá. Princípios de base de uma nova museologia, 1972. 3 p.



OLIVEIRA-GODET, Rita; PEREIRA, Rubens Alves. Memória em movimento: O sertão na arte de Juraci Dórea. Feira de Santana: UEFS, 2003, 147 p.



Morais, Frederico. A arte popular e sertaneja de Juraci Dórea: uma utopia? Salvador: Cordel, 1987.









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